segunda-feira, 16 de fevereiro de 2009

Fracturas e facturas


1 - Nada como um congresso do Bloco de Esquerda para se relançar a discussão sobre temas fracturantes. No caso, o casamento entre pessoas do mesmo sexo e a eutanásia. Com uma nuance, os ditos temas fracturantes desta vez foram introduzidas pelo PS e não pelo Bloco. Até a chamada “esquerda caviar” já percebeu que, nos tempos que correm, os portugueses estão pouco interessados em fracturas e mais preocupados em encontrar fórmulas para pagar as muitas facturas que já chegaram e as que chegarão. Nem que para isso seja preciso proibir os despedimentos e nacionalizar os bancos.

2 – A novela BPN avança e com ela um emaranhado de revelações que remete sem pudor para a palavra roubalheira. Os últimos depoimentos na Assembleia da República são esclarecedores sobre a falta de vergonha de uma elite (?) que chegou ao poder político à boleia de Cavaco Silva e depois se lançou na alta finança a reboque de uma evidente falta de escrúpulos. Obviamente não é o caso de Dias Loureiro, conselheiro de Estado a quem o presidente da República continua a oferecer protecção política. Aquele que foi uma das eminências pardas do regime durante os últimos 20 anos é acusado de mentir quanto à sua participação nas negociatas. Mas a isso contrapõe com a sua falta de memória. Era muita papelada. O que vale é que há um Governo socialista fracturante que se disponibilizou a pagar a factura: são 1400 os milhões de euros que a CGD já injectou no BPN.

3 – O Produto Interno Bruto caiu 2% no último trimestre do ano, o dobro do que se previa. Se o falhanço nas previsões continuar – a probabilidade é grande – então teremos de nos preparar para uma descida do PIB de 4% nos primeiros três meses deste ano. Uma fractura que implicará mais uma factura. Basta olhar para os números sobre despedimentos colectivos para perceber que será elevada. Em Dezembro já tinha havido 46 empresas a iniciar processos de despedimento colectivo sobre 489 trabalhadores. Em Janeiro passaram a ser 87 empresas e 1414 trabalhadores. E já se percebeu que a espiral não vai parar por aqui.

4 – Acossado pela crise e pela “campanha negra”, José Sócrates decidiu anunciar um castigo aos ricos, para beneficiar os pobres. Mas poucos minutos bastaram para se perceber que os ricos não são propriamente ricos e que os pobres vão ter de esperar para saber o que ganharão com isso. O que propõe então o primeiro-ministro? Acabar com os offshore? Aumentar os impostos sobre a banca? Tributar as mais-valias mobiliárias? Vamos com calma, que não vale a pena abrir fracturas desse género em tempo de eleições. Por enquanto a punição aos ricos fica-se pela diminuição das deduções com despesas de saúde e de educação. E apenas aos ricos que vivem dos rendimentos do seu trabalho. Quem ganha a vida com acções, offshore, ou ambos, continuará a salvo.
(*) Crónica originalmente publicada no JN desta segunda-feira

1 comentário:

Anónimo disse...

As origens do nosso «Primeiro» são a social democracia. Nada contra. Cada qual assume as ideologias que entende. O que é batota, da grossa, é vestir-se, pretensamente, de homem de esquerda. Quando não é. Lamento que ele possa enganar alguns incautos. Os que têm sempre a memória muito curta e na altura da votação, perdoam, esquecem e irão votar na «rosa». Nem sequer na «enjeitada», do fado. Na rosa «travestida» agora, a meses das eleições. Num manto de fantasia e hipocrisia. Numa simbiose de bandeira vanguardista com amigos do capital. Não do capital que fomenta, incrementa, investe. Mas do capital parasita. Envolvido sempre nos grandes negocios financeiros. E a crise não foi, por acaso, motivada por esses senhores? Socrates é, na melhor linguagem popular, um «charlatão». Como pode alguém, que desde o inicio do seu mandato, espezinhou, sempre, os mais desfavorecidos, que congelou, 2anos, os aumentos da função publica, vir agora, do alto da sua arrogancia, dare lições e orientações de esquerda??? Seja coerente. Volte às suas origens. Foi na JSD que nasceu, regresse e fique por lá. Nada contra. Oque não pode á namorar à direita e à esquerda consoante as circunstancias.