sexta-feira, 27 de fevereiro de 2009

Mais um arquitecto


O arquitecto Nuno Brandão Costa - que foi ontem distinguido com o mais importante prémio português de arquitectura, o Secil - gosta de edifícios com um programa bem definido. Foi isso que lhe aconteceu quando recebeu a encomenda da obra que o júri da Secil acaba de premiar: o Edifício Administrativo e Show-Room Móveis Viriato, em Rebordosa, no concelho de Paredes, próximo do Porto. O Prémio Secil é atribuído de dois em dois anos a edifícios que "incorporem o material primordial da actividade da Secil - o cimento - e que constituam peças significativas no enriquecimento da arquitectura portuguesa". Nuno Brandão Costa nasceu em 1970 no Porto, onde se formou e trabalha. É professor na Faculdade de Arquitectura.


in Público


Só para acrescentar que pode ser nado no Porto, mas foi criado em Matosinhos. Ali para os lados da Urbanização do Real. Isso não faz com que seja pior nem melhor, mas faz com que seja dos nossos. Sem bairrismos bacocos, está bom de ver.
PS: Para quem quiser conhecer melhor o arquitecto e a sua obra, aconselho uma vista de olhos ao trabalho publicado na edição de domingo do P2, no Público

O Mundo em que vivemos

No Irão, um homem foi enforcado, depois da “comutação” da pena original, que era a lapidação. O crime cometido foi o de adultério. No corredor da morte, também candidatos às pedradas de misericórdia, estão mais cinco pessoas, quatro dela obviamente mulheres, essas putas (desculpem lá o calão, mas tem mesmo de ser assim).

Nos Estados Unidos, uma mulher de 33 anos, desempregada, solteira e já com um rancho de filhos, conseguiu que lhe fizessem uma inseminação. Teve oito catraios. E com isso ganhará certamente um lugar nas revistas e talk shows televisivos de celebridades e mostrengos (que muitas vezes são uma e a mesma coisa). Entretantos, a principal produtora de filmes pornográficos do Mundo – a Vivid – já lhe propôs um excelente contrato: um milhão de dólares se aceitar protagonizar um filme. Querem transformar a mamã numa puta.

Em Braga e numa feira de livro em saldo alguém se lembrou de pôr à venda um livro com o título de Pornocracia (a autora devia estar a pensar em histórias semelhantes à do parágrafo anterior quando se lembrou do título). A enfeitar a obra uma pintura realista do sexo de uma mulher. Foi um festival na cidade dos arcebispos. Ainda se fosse um anjinho e a respectiva pilinha… O que aconteceu é que a PSP, zelosa, recolheu a obra, para evitar desacatos. Acho que fez muito bem, ainda que tenha sido pintado por um tal Coubert, ainda que o original esteja exposto no Quai d’Orsay. Digam o que disserem sobre a qualidade estética da obra, o que aquilo parece é o retrato de uma puta.

segunda-feira, 23 de fevereiro de 2009

Profissionais da política


1. Elisa Ferreira formalizou a sua candidatura à presidência da Câmara Municipal do Porto. Reuniu os seus na Alfândega, ouviram-se declarações de amor à cidade. Mas também ficou claro que, antes disso, vai garantir a renovação do seu lugar de eurodeputada. Presume-se portanto que a paixão em relação ao Parlamento Europeu também seja grande, embora talvez não chegue a ser "até à medula", como se diz ser no caso da Invicta. Só que o PSD, rápido a reagir, chamou-lhe outra coisa: "oportunismo político" e "vontade de ocupar um cargo qualquer".
Na verdade, quem providenciou as munições ao adversário foi a própria Elisa Ferreira, quando disse que, a ser eleita para a presidência da Câmara, abandonará o lugar em Estrasburgo. Ou seja, só quando garantir um segundo cargo tratará de abandonar o primeiro. Ao jeito de, mais vale um pássaro na mão do que dois a voar... E portanto não se poderá queixar senão de si própria se esta "falta de respeito pelo Porto", ainda para citar o PSD, se transformar em tema recorrente da campanha que se avizinha.
Questão diferente é saber, para além do ruído de fundo, se isso a diminui perante a candidatura de Rui Rio. E a resposta é obviamente negativa. O que a decisão de Elisa Ferreira confirma é que ela é uma profissional da política. Anteontem deputada, ontem ministra, hoje eurodeputada, amanhã logo veremos. Tal qual Rui Rio, anteontem deputado, ontem secretário-geral do PSD, hoje autarca, amanhã potencial candidato a líder do PSD.

2. Servirá para alguma coisa investir na formação de "doutores" se não há trabalho para eles? Para que serve um "canudo" se o melhor que se consegue arranjar é um lugar como caixa de supermercado? São algumas das perguntas que se podem fazer quando se observa a assustadora tabela de produção de desempregados das nossas universidades. Que chega a ser chocante, quando se sabe, por exemplo, que a área do Direito é uma das mais saturadas (1237 desempregados) e, não obstante, o contingente de novos alunos não só se mantém elevado de ano para ano, como vai aumentando. Em nome da garantia de financiamento estatal que alimente um corpo docente com dimensão e regalias que já não se justificam. Uma burla a que é preciso pôr fim. No Direito, como na Psicologia, na Economia ou na Gestão.
Mas se as perguntas iniciais são legítimas, outras conclusões, de sentido inverso, podem ser igualmente poderosas. Porque dizem as estatísticas que um desempregado com formação superior encontra emprego mais depressa do que os outros. E porque nos diz o senso comum que é sempre melhor ter alguma formação, por inútil que aparente ser, do que nenhuma. Sempre permite ambicionar a algo mais do que permanecer na caixa de um supermercado durante toda a vida.
(*) Crónica originalmente publicada no JN desta segunda-feira

quinta-feira, 19 de fevereiro de 2009

O grande irmão

Assunto: Utilização de Base de Dados pela «Associação Narciso Miranda – Matosinhos Sempre»
Destinatário: Comissão Nacional de Protecção de Dados
Ex.mo Sr. Presidente da Assembleia da República
A «Associação Narciso Miranda – Matosinhos Sempre» divulgou, recentemente, um mailing por ocasião da apresentação da candidatura de Narciso Miranda à Câmara Municipal de Matosinhos.
A este respeito, consideramos essencial um esclarecimento sobre a origem da base de dados utilizada e se está ou não registada como tal na Comissão Nacional de Protecção de Dados.
Atento o exposto, os deputados do PSD – Partido Social Democrata abaixo assinados requerem, ao abrigo das disposições regimentais aplicáveis, que lhes seja informado o seguinte:
1. Existe alguma Base de Dados licenciada na Comissão Nacional de Protecção de Dados em nome da «Associação Narciso Miranda – Matosinhos Sempre»?
Palácio de São Bento, 17 de Fevereiro de 2009.
Os Deputados
Miguel Santos
Agostinho Branquinho
Não faço ideia se o mailing tem muitos ou poucos nomes. Não sei se os contactos e os dados que lá estão foram ou não voluntariamente entregues por quem faz parte do mailing. E também não sei se o procedimento é legal ao não. Mas já se nota que o PSD está à espreita. E vai disparar sobre tudo o que mexe.

quarta-feira, 18 de fevereiro de 2009

A farsa vianense

Narciso Miranda não confirma nem desmente eventuais convites do PS para protagonizar uma candidatura à presidência da Câmara de Viana do Castelo, uma autarquia liderada há 15 anos pelo socialista Defensor Moura que terá entrado em rota de colisão com a distrital do partido. Contactado ontem pelo PÚBLICO, Narciso Miranda recusou-se a fazer declarações sobre Viana do Castelo, frisando apenas que "a sua candidatura vai acontecer em Matosinhos".
in Público de 17/02/2008

Não interessa de falam bem ou mal, o que interessa é que falem de mim. Há muitos anos que Narciso Miranda assimilou esta máxima. E temos que reconhecer a sua mestria em aplicá-la. Um tipo qualquer de uma rádio manhosa de Viana do Castelo, movido sabe-se lá por quê e por quem, inventa uma rábula e uma data de jornais engolem a história. E seguem-se notícias, artigos de opinião e comentários um pouco por todo o lado [incluindo este]. São mais uns minutinhos de fama. Duvido é que sirva para alguma coisa.

segunda-feira, 16 de fevereiro de 2009

Nada de especial

Na última segunda-feira, por volta das 11 horas da manhã, ouviu-se o barulho de uma explosão na Petrogal, em Leça da Palmeira. A população em redor toda ela sentiu o abalo e os mais próximos até dizem ter visto labaredas. Contactado pelo “Matosinhos Hoje”, o responsável da Protecção Civil de Matosinhos explicou que se tratou de uma explosão que ocorreu durante a ligação de equipamento, mas que se tratou de uma situação normal (!). Segundo Salgado Rosa, as fornalhas quando estão muito tempo paradas, necessitam de manutenção e de limpeza. Foi ao reactivar as fornalhas que se deu uma “pequena fuga de gás”, que originou a explosão. Contudo, o comandante garantiu que “não foi nada de especial” e que nem foram accionados os meios de intervenção, quer da Petrogal quer da Protecção Civil de Matosinhos.
in Matosinhos Hoje
Há uma explosão na refinaria da Petrogal, mais uma, e o melhor que a pessoa responsável pela Protecção Civil Municipal tem para dizer às pessoas é que "não foi nada de especial". Pelos vistos faz escola a posição proteccionista a uma empresa que, apesar de importante para Matosinhos, já demonstrou vezes de mais que não merece o benefício da dúvida. Pergunto o mesmo que Joaquim Queirós no comentário que acompanhava a notícia. Um explosão de gás é uma coisa normal? Não seria de tomar medidas para que esta normalidade não se repita? Só para concluir: dispam lá o fato de macaco da Petrogal e vistam a farda do serviço público. Ou qualquer dia começamos a achar que recebem gasolina de borla.

Fracturas e facturas


1 - Nada como um congresso do Bloco de Esquerda para se relançar a discussão sobre temas fracturantes. No caso, o casamento entre pessoas do mesmo sexo e a eutanásia. Com uma nuance, os ditos temas fracturantes desta vez foram introduzidas pelo PS e não pelo Bloco. Até a chamada “esquerda caviar” já percebeu que, nos tempos que correm, os portugueses estão pouco interessados em fracturas e mais preocupados em encontrar fórmulas para pagar as muitas facturas que já chegaram e as que chegarão. Nem que para isso seja preciso proibir os despedimentos e nacionalizar os bancos.

2 – A novela BPN avança e com ela um emaranhado de revelações que remete sem pudor para a palavra roubalheira. Os últimos depoimentos na Assembleia da República são esclarecedores sobre a falta de vergonha de uma elite (?) que chegou ao poder político à boleia de Cavaco Silva e depois se lançou na alta finança a reboque de uma evidente falta de escrúpulos. Obviamente não é o caso de Dias Loureiro, conselheiro de Estado a quem o presidente da República continua a oferecer protecção política. Aquele que foi uma das eminências pardas do regime durante os últimos 20 anos é acusado de mentir quanto à sua participação nas negociatas. Mas a isso contrapõe com a sua falta de memória. Era muita papelada. O que vale é que há um Governo socialista fracturante que se disponibilizou a pagar a factura: são 1400 os milhões de euros que a CGD já injectou no BPN.

3 – O Produto Interno Bruto caiu 2% no último trimestre do ano, o dobro do que se previa. Se o falhanço nas previsões continuar – a probabilidade é grande – então teremos de nos preparar para uma descida do PIB de 4% nos primeiros três meses deste ano. Uma fractura que implicará mais uma factura. Basta olhar para os números sobre despedimentos colectivos para perceber que será elevada. Em Dezembro já tinha havido 46 empresas a iniciar processos de despedimento colectivo sobre 489 trabalhadores. Em Janeiro passaram a ser 87 empresas e 1414 trabalhadores. E já se percebeu que a espiral não vai parar por aqui.

4 – Acossado pela crise e pela “campanha negra”, José Sócrates decidiu anunciar um castigo aos ricos, para beneficiar os pobres. Mas poucos minutos bastaram para se perceber que os ricos não são propriamente ricos e que os pobres vão ter de esperar para saber o que ganharão com isso. O que propõe então o primeiro-ministro? Acabar com os offshore? Aumentar os impostos sobre a banca? Tributar as mais-valias mobiliárias? Vamos com calma, que não vale a pena abrir fracturas desse género em tempo de eleições. Por enquanto a punição aos ricos fica-se pela diminuição das deduções com despesas de saúde e de educação. E apenas aos ricos que vivem dos rendimentos do seu trabalho. Quem ganha a vida com acções, offshore, ou ambos, continuará a salvo.
(*) Crónica originalmente publicada no JN desta segunda-feira

sexta-feira, 13 de fevereiro de 2009

Em nome da rosa


Vai começar a campanha na rua. Os jotas do PSD, como ainda não têm candidato, começam por se entreter gozando os candidatos dos outros. E já idealizaram um outdoor que hão-de colocar numa rotunda qualquer um destes dias. Aqui fica um exemplar em primeira mão. Só não dá é para perceber que personagens do romance de Umberto Eco correspondem a cada um. Presume-se que será o de inquisidores (os maus), porque o franciscano (o bom), ainda não deu a cara...

Investimento e propaganda


O investimento público é assim tão importante para recuperar a nossa falida economia? Tenho dúvidas mas, como se costuma dizer no futebol, na dúvida, beneficie-se quem ataca. No caso, quem quer investir. Mas com bom senso e sem esta espécie de fé cega com que nos bombardeiam todos os dias. Ou seja, se for para construir uma linha de TGV para Madrid que não serve para nada, a não ser honrar compromissos com Espanha, não vale a pena. Se for para construir ou remodelar escolas, venha o investimento.

E é aqui que entra Matosinhos. Porque a nossa Câmara anunciou, por estes dias, um pacote de investimentos em escolas. E este é investimento que interessa porque, para além da massa de cimento usada nas construções, tem potencialidade para desenvolver alguma massa cinzenta nos meninos e meninas que temos também em construção. Mas se é bom saber que haverá investimento na área, também convém saber separar o que é importante do que não passa de propaganda.

Exemplo? O anúncio de abertura de 10 concursos públicos em outras tantas escolas, durante os próximos meses, foi convenientemente embrulhado num imenso pacote de obras no valor de 48 milhões de euros. Em que se inclui o que está em vias de avançar, mas também o que não se sabe ainda quando avança, o que já avançou e até o que já está concluído. E assim sendo, até podemos dizer que a máquina de comunicação pecou por defeito. Já agora podiam ter incluído tudo o que se fez nos últimos 20 anos, adequando os preços ao presente, e conseguiriam chegar a um número bem mais giro, tipo 100 milhões.

Não chegava ser verdadeiro? Anunciar os concursos para 10 escolas e fazer a festa com isso? É mesmo preciso juntar sempre a mesma conversa da treta? Acreditam mesmo que o povo é assim tão parvo?

quinta-feira, 12 de fevereiro de 2009

Retail Park


Um projecto de relevante interesse público municipal. Sobretudo na actual conjuntura económica e tradicional. Quem assim argumenta é uma tal de Divisão da Promoção da Economia Local [belo emprego] da Câmara Municipal de Matosinhos.
E o que defendem com tanta veemência os promotores da nossa economia? Uma unidade de semi-condutores? Um centro de investigação? Uma fábrica seja lá do que for?... Não faltava mais nada, estamos em Matosinhos, o que está a dar é a especialização na venda de calças, colchas e estampados. O que nos propõem é, por isso, um "retail park". Porque nesta época de crise, o que os portugueses, e sobretudo os matosinhenses, precisam mesmo é de sítios onde gastar os euros que não têm.
E escusam de ser maledicentes, porque o projecto tem várias vantagens. Uma delas é o facto de nos livrar de mais uns metros quadrados de Reserva Ecológica Nacional. Eu pelo menos não conheço ninguém que se alimente de erva. E o "retail" terá certamente uns cafés e quem sabe algum McDonald's ou até [há que ser ambicioso] um restaurante Frango da Guia.
Por outro lado, como também nos explicam, representa um investimento de 40 milhões de euros, que inclui novas estradas e parques de estacionamento, o que constitui um óbvio sinal de modernidade, mesmo que as ditas infra-estruturas sirvam exclusivamente o tal "retail".
Finalmente, a cereja no topo do bolo. Vai criar 1800 postos de trabalho directos. Os 150 trolhas que o vão construir, mais para aí uns 20 empregados por cada uma das 16 "mega-stores", o que dá logo para uns 320.
Só isto já dá 470 empregos, embora provisórios, porque a obra há-de acabar um dia e os trolhas terão de procurar outro "retail" para construir, enquanto as lojas também hão-de fechar, embora neste caso haja sempre a hipótese de reconverter os espaços para lojas de chineses.
Claro que ainda estamos longe dos 1800 anunciados, mas é só porque me esqueci de contabilizar os operadores de gruas.
Depois temos ainda os postos de trabalho indirectos, que parece que vão ser mais 500. Para aí uns 50 serão arrumadores, outros 50 contratados pela Câmara para fiscalizar as obras, mais 50 para criar os frangos para o Frango da Guia, e os restantes não sei, perguntem à Divisão de Promoção de Economia Local...

segunda-feira, 9 de fevereiro de 2009

O mercado pode ser livre?


1 - Começa a ser tempo de aplicar à economia aquela máxima que diz que a liberdade de um acaba quando começa a liberdade do outro. E vem isto a propósito do vertiginoso carrossel de despedimentos a que vimos assistindo nas últimas semanas. De repente, todos os gestores de empresas - sejam daqueles formados em escolas com nomes anglo-saxónicos, sejam os que subiram a pulso ou a golpes de cotovelo - descobriram que é preciso reduzir custos. A forma mais rápida de o fazer é com despedimentos. Já nem interessa se a empresa atravessa ou não um período difícil. Se não atravessa agora, é certo que isso acontecerá nos próximos dias ou semanas. Sobretudo quando se vive uma crise que também é alimentada pelo pânico e que, por isso, tem as costas ainda mais largas. Tão largas que o homem mais rico do país não hesita quando se trata de transformar a crise numa oportunidade. E logo através da Corticeira Amorim que, em 2008, registou mais de 10 milhões de euros de lucros. Eu repito, 10 milhões, ou, para os mais antigos, dois milhões de contos. Presume-se que para 2009 a previsão de lucros seja menor. E à conta dessa presunção, 193 pessoas, as mesmas que contribuíram para os fabulosos lucros da Corticeira Amorim em 2008 e nos anos anteriores, vão para o olho da rua. É por causa de casos como este - e não é único, apenas o mais mediático - que se percebe a proposta arriscada que Francisco Louçã apresentou este fim- -de-semana: proibir, por decreto, uma empresa com lucros de despedir os seus trabalhadores. Um disparate? Uma medida soviética? Um dislate de um esquerdista radical? Poder-se-á dizer o que se quiser. Eu por mim limito-me a observar que o livre arbítrio só pode ser aplicado ao mercado se não se resvalar para a arbitrariedade. E o problema é que é precisamente isso que está a acontecer.



2 - E de repente as notícias já não remetem para a investigação, mas para quem investiga. Porque de repente todos os magistrados que estão envolvidos no processo Freeport se sentem vigiados, ou escutados, por misteriosos espiões. Detectaram-se vírus informáticos desconhecidos e telemóveis que fazem barulhos esquisitos. É um clássico. As "secretas" - tal como a crise de que se fala mais acima - também têm as costas largas. Porque, se estiverem a investigar, têm de o desmentir, uma vez que as investigações são "secretas". Se não estiverem a investigar, também têm de desmentir. Num caso como no outro, fica a suspeita. E assim se junta mais uma anedota ao caso Freeport. No caso presente, ainda temos um procurador-geral da República que parece alimentar a farsa, quando, em tom de brincadeira, terá comunicado aos seus pares do Ministério Público que pediu ao chefe dos espiões que investigasse as fugas de informação relativas ao caso Freeport. E daí rapidamente se conclui que pediu à "secreta" que investigue magistrados. Ou seja, que um dos garantes da legalidade terá pedido que se cometa uma ilegalidade. Não dá para acreditar.
(*) Crónica originalmente publicada no JN desta segunda-feira

domingo, 8 de fevereiro de 2009

Sem guita para salários


Já não há dinheiro nem para pagar salários. É o que se pode concluir de uma das propostas que vai esta segunda-feira a votação na reunião da Câmara Municipal de Matosinhos. Como os euros não crescem nas árvores (expressão usada apenas para justificar a imagem) são cinco milhões que é preciso pedir emprestados, para resolver "dificuldades de tesouraria". Que é como quem diz socorrer cofres vazios.
Mas do que eu gosto mesmo, quando me dou ao trabalho de ler estas coisas, é da linguagem pretensamente inteligente que vertem para os documentos. No preâmbulo da justificação podem ler-se pérolas como "minimizar os efeitos da volatilidade das receitas municipais" (eu cá trocaria por evaporação), ou expressões como "quantidade e intensidade de flutuações e oscilações" (neste caso, poderíamos optar por variação e variação).
Adiante, que, embora as explicações pareçam ser propositadamente baralhadas, não vá alguém percebê-las, dá para seguir o rasto do dinheiro. E uma das coisas que ficamos a saber é que o volume mensal de despesas correntes "obrigatórias" (imagino que as "não obrigatórias" sejam as que se pode pagar mais tarde a uns quantos desgraçados) é de pelo menos 2,5 milhões de euros. E como pelos vistos andam pela autarquia 10 milhões de euros em facturas, que nunca se sabe quando podem ser cobradas, as receitas não chegam para tapar os buracos. A culpa deve ser da crise.
Disso ou do excesso de optimismo na hora de prever as receitas. Se bem me lembro (na verdade não lembro, mas fui procurar), o orçamento para 2008 previa, só em receitas correntes, qualquer coisa como 95 milhões de euros. A julgar pelo mapa de receitas que acompanha a proposta para contrair o empréstimo, só conseguiram 58 milhões. O problema é que, se calhar no que diz respeito a despesa corrente, não só não ficou aquém, como é capaz de ter ido além...

sexta-feira, 6 de fevereiro de 2009

A lógica da batata

Deu-me para observar os resultados das últimas cinco eleições autárquicas aqui na nossa terra, registei alguns factos e tirei algumas conclusões. Que podem ser úteis (ou não) para alimentar teorias sobre o que pode acontecer nas próximas. Aqui fica o rol:

1 - De 1993 até 2005, o PS esteve sempre em rota descendente. Os "coreanos" 65% de 1993 são uma miragem se comparados com os 47% de 2005, já com Guilherme Pinto. Mas, curiosamente, o maior trambolhão foi entre 1997 e 2001, ainda com Narciso Miranda, quando a queda foi de 8 pontos percentuais. Se em 2009 se mantivesse a tendência, o PS iria parar aos 40%. A dividir por dois candidatos dá 20% para cada um. Mas cuidado, porque, como se costuma dizer, a lógica às vezes é uma batata.

2 - O PSD e o CDS/PP, pelo menos em listas autárquicas, valem mais em conjunto do que a soma das partes. Eu explico. Em 1993 e 1997, em que concorreram separados, não conseguiram mais do que 25%. Em 2001 e 2005, quando concorreram coligados, conseguiram resultados à volta dos 30%. Parece ser uma espécie de patamar mínimo, o que, num cenário renhido como o de 2009, não é propriamente uma má notícia.

3 - A CDU anda, desde 1993, com um resultado de 7/8%. O que já foi suficiente para ter vereador como para não ter. Ou seja, continuará, como sempre, no fio da navalha. Mas as coisas poderão piorar. Porque o Bloco cresceu de 2% para 7% nas duas últimas eleições, aliás as únicas em que apresentou candidatos. E a grande incógnita é se será capaz de crescer um pouco mais. Se for, e não precisa de ser muito, é bem capaz de ir buscar o vereador que nos últimos dois mandatos foi dos comunistas. Uma hipótese a ter seriamente em conta.

Resultados (para quem quiser fazer as suas próprias especulações):

2005
PS - 47
PSD/CDS - 30
CDU - 8
BE - 7

2001
PS - 54
PSD/CDS -31
CDU - 7
BE- 2

1997
PS - 62
PSD - 22
CDU - 7
CDS - 3

1993
PS - 65
PSD - 21
CDU - 6
CDS - 4

1989
PS - 59
PSD - 25
CDU - 8
CDS - 2

segunda-feira, 2 de fevereiro de 2009

O atoleiro


Casa Pia, Apito Dourado, Operação Furacão, Portucale, Freeport. Nos últimos anos, os portugueses têm sido surpreendidos por uma série de processos judiciais que provocam sentimentos contraditórios. Primeiro cria-se a expectativa de que a nossa Justiça funciona, de que os nossos magistrados não receiam investigar os poderosos, de que somos todos iguais perante a lei. Resumindo, cria-se a convicção de que vivemos num país com uma democracia sólida. Mas a ilusão de um Portugal moderno e adulto dura sempre pouco. Rapidamente estes processos se transformam num atoleiro judicial que serve para pouco mais do que encher páginas de jornais e animar conversas de café.
Veja-se o célebre processo Casa Pia. É verdade que conseguiu chegar à fase de julgamento. Mas quantos “pedófilos” foram, pelo meio, apontados na praça pública, sem hipótese de defesa? E o Apito Dourado, essa mega-investigação que permitiria acabar de vez com a corrupção no futebol, para que serviu? Sobretudo para tornar públicas dezenas de escutas telefónicas, para gáudio de milhões de espectadores deliciados com o vernáculo utilizado pelos principais dirigentes do futebol português. A Operação Furacão arrasta-se de busca em busca, numa espécie de fuga para a frente que a transforma numa meada de que já ninguém encontra a ponta. Ao processo Portucale aconteceu-lhe o mesmo que aos sobreiros, foi abatido. E temos agora o Freeport.
Um caso em que José Sócrates não sendo suspeito, está sob suspeita. E sendo José Sócrates o primeiro-ministro de Portugal, o caso ganha contornos de “assunto de Estado”, como reconhece Cavaco Silva. Esse facto, por si só, não impedirá que, como nos exemplos anteriores, o processo se transforme num atoleiro judicial. Com todos os ingredientes para evoluir para um atoleiro político. E ainda por cima no momento em que o país (e o Mundo) ameaça resvalar para um dos piores atoleiros económico-sociais de que há memória. Tudo somado, é real a ameaça que paira sobre o nosso destino colectivo. É essa a responsabilidade que pesa sobre quem tem que investigar e clarificar este caso.
Uma investigação que tem de ser concluída de forma célere. Ainda que seja apenas na parte que diz respeito ao envolvimento do primeiro-ministro. E que precisa de um comunicação clara e objectiva. Que não tem acontecido até aqui. Ora se divulga um comunicado da PGR em que se diz que José Sócrates não pode ser considerado suspeito; ora se ouve Cândida Almeida dizer que todos o que intervieram nesta situação são suspeitos, mesmo que não haja arguidos. Presume a magistrada que esta nuance jurídica deixa a opinião pública tranquila. Não deixa. Muito menos se a ouvirmos dizer, logo a seguir, que os governos de gestão decidem coisas que não devem decidir. A afirmação é incontestável, o contexto em que é proferida transforma-a numa frase incendiária.


*Crónica originalmente publicada no JN desta segunda-feira