segunda-feira, 12 de maio de 2008

Será que chega?

“Mar. Movimento. Cultura.” O lema corresponde à imagem que actualmente pretende projectar-se de Matosinhos. Mas como todos os lemas, peca por defeito e por excesso. Por defeito, porque o concelho é muito mais do que a soma de bons restaurantes, praias de bandeira azul, marginais requalificadas ou actividade cultural intensa. Por excesso, porque mascara a crise de uma actividade tradicional como a pesca, os recorrentes problemas ambientais da orla marítima ou as críticas a um certo elitismo na programação cultural.
Valha a verdade, no entanto, que é apenas um lema, marketing político que cada um aceitará ou rejeitará. Na verdade, mais do que um lema, do que Matosinhos porventura precisa é de debate público sobre o seu futuro e sobre as suas debilidades. Um debate a que o Poder Local, em Matosinhos, como nos outros concelho do país, habitualmente foge. Com este suplemento, o JN dá também o seu contributo para a formação de uma opinião mais esclarecida sobre alguns dos temas mais importantes para o futuro de um concelho que, para o bem e para o mal, sofreu uma profunda transformação nas últimas décadas.
Ao longo destas páginas reunimos informação e opiniões sobre questões como, por exemplo, o futuro da Exponor. Uma parque de exposições que já viveu tempos áureos mas que se encontra, hoje, numa encruzilhada. O projecto de transferência da vertente expositiva para o Europarque de Santa Maria da Feira falhou e, com isso, a oportunidade de requalificar e revitalizar uma zona nobre de Leça da Palmeira. O centro tecnológico que se prometeu, com pompa e circunstância, parece irremediavelmente fracassado. E da parte da Associação Empresarial de Portugal (AEP) não se encontra mais do que um silêncio confrangedor.
O mesmo silêncio em que se esbarra quando tenta questionar-se os responsáveis da Petrogal sobre o futuro da refinaria de Leça da Palmeira. Disso se queixam os jornalistas, como os autarcas das juntas de freguesia mais próximas de uma unidade industrial agressiva para os que a rodeiam. Uma infra-estrutura que quase todos continuam a classificar como essencial para a economia de Matosinhos, mas que outros consideram um anacronismo. Seja o que for, uma empresa que tem demonstrado pouco ou nenhum respeito pelo meio-ambiente e, portanto, pela qualidade de vida da população que vive em seu redor.
Uma população “que vive”, e não apenas “que dorme”, como defende o arquitecto Alcino Soutinho, que entrevistamos nestas páginas. Matosinhos já não é – e provavelmente nunca foi – uma cidade-dormitório do Porto. Embora encerre dentro de si uma série de dormitórios. Porque não basta ter uma área residencial desenhada por arquitectos de prestígio para se ter uma cidade equilibrada.
Paradigma? Matosinhos-Sul, a grande urbanização que se ergue sobre as ruínas das conserveiras. Um conjunto de quarteirões em que a habitação de qualidade cresce, mas em que são escassos os equipamentos públicos. Não há creches, não há escolas, não há centro de saúde, não há jardins. Tem marginal, restaurantes, actividade cultural. Ou seja, tem “Mar. Movimento. Cultura.” Será que chega?
[Editorial originalmente publicado no suplemento
sobre Matosinhos que se publica no JN de hoje]